Carioca da Gávea, com 36 anos, Fernando estudou no São Bento e fez música e direito ao mesmo tempo. Após um rico intercâmbio na França, de onde voltou cheio de ideias e projetos, ao retornar ao Brasil abriu o badalado Meza Bar, no Humaitá. Apaixonado pela Cidade, decidiu dedicar parte de seu escasso tempo ao segmento que abraçou e hoje preside o Sindicato de Bares e Restaurante do Rio de Janeiro (SindRio).
O SindRio é uma instituição empresarial fundada em 1911 com a missão de contribuir de forma permanente para a melhoria do ambiente de negócios do setor de bares e restaurantes. Atualmente, o SindRio representa os interesses de mais de 11.000 empresas, que geram 110 mil empregos diretos.
Da cadeira em que lidera a centenária entidade, com estreita relação com os Poderes da República, nas três esferas da Federação, Fernando concedeu a seguinte entrevista à Revista da Carreira.
RC: Fernando, como foi o início da sua carreira?
FB: Fiz, simultaneamente, direito na UERJ e música na Escola de Música Villa-Lobos. Logo no começo da faculdade de direito, estagiei em um escritório especializado no terceiro setor. Naquela época, trabalhei muito com associações e com organizações nacionais e internacionais, tanto do setor público, como do privado. De alguma forma, participei de elaboração de convênios, parcerias, projetos sociais e de responsabilidade social corporativa etc. Primeiro, como estagiário, depois, como advogado. Só que nesse ínterim fui fazer uma parte da faculdade na França e…
RC: Que interessante! Como foi?
FB: Na França, vivi experiências bem legais. Tive a oportunidade de fazer um estágio na UNESCO, em Paris. Foram mais ou menos quatro meses de muito aprendizado. Quando voltei de Paris para terminar a faculdade, já cheguei com a ideia de abrir um bar no Rio. Isso ficou muito claro para mim. Por isso que abri o Meza, que é o meu negócio, e esta aberto até hoje. Abri o bar e fiz monografia ao mesmo tempo… (risos)
RC: Por que depois da formação em música e da vivência profissional na área do direito pensou em empreender na área de gastronomia?
FB: Na verdade, nas faculdades brasileiras, vi muita coisa interessante. No entendo, não encontrei por aqui aquilo que eu realmente queria fazer. Coincidiu que, na época, o Rio estava no auge das redes de botecos chamados “pé limpo”. Tinha o Informal, o Conversa Fiada, o Espelunca Chique, o Manoel & Joaquim. Portanto, chope e petisco era o legal da época. Mas existia espaço para outras experiências. Para bar e gente diferente. Foi então que abrimos o Meza Bar, um gastrobar focado em coquetelaria autoral, com a nossa identidade. Acima de tudo, isso causou importante impacto no mercado. Hoje, muita gente reconhece que se existe coquetelaria autoral na noite carioca é por conta do Meza.
RC: Você diria que o Meza foi o inventou da coquetelaria autoral?
FB: Foi o pioneiro. Porém, como era algo que faltava no leque de possibilidades do Rio, é possível imaginar que, se a gente não tivesse feito, viria outro e faria. Mas a realidade é que fomos nós que fizemos e provamos que era viável e possível o carioca gostar desse modelo de entretenimento e consumo.
RC: Sua família te apoiou?
FB: Na época, não tinha muito desse tipo de espaço. Fui fazendo, confiando, com autonomia. Meus pais me apoiavam. No entanto, a iniciativa era muito minha. Na minha família não tem nem advogado e nem empresário. Por exemplo, meu pai é engenheiro e minha mãe, jornalista. Meus avós eram militares. Logo, ninguém me influenciou nas minhas escolhas. Tudo é uma historia muito minha…
RC: Como foi se tornar empreendedor?
FB: Logo nos primeiros dois anos do Meza, eu estava advogando e tentando me equilibrar entre as duas coisas. Como eu tinha um sócio, alternava como ele a jornada. Enfim, vivia assim: de dia, advogado; de noite, dono de bar. Interagia com os dois mundos. Porém, chegou a hora que a jornada ficou pesada. Até porque tinha vontade de abrir outras coisas. Estava gostando de empreender e o direito não é tão propício ao empreendedorismo, no dia a dia, concorda? (risos).
RC: Como ocorreu o divisor de águas? Quando e como você fez a sua opção?
FB: Enquanto eu advogava, gostava muito de lidar com projetos e pessoas que valiam a pena defender. Certamente, era legal trabalhar com esse propósito. Saber que outros podem fazer a diferença através do seu auxílio é muito gratificante. Aliás, independentemente dos honorários. Dessa forma, eu via resultados acontecerem a partir do meu trabalho e me sentia realizado. Mas eu era muito mais jovem. Vinte e poucos anos. Porém, eu queria um dia a dia mais dinâmico. Como eu já estava no mundo dos negócios, vendo as coisas acontecerem com outra velocidade, acabou que fiz a minha opção.
RC: E o relacionamento com o SindRio, como começou?
FB: Eu já era associado. Aliás, não só como proprietário do Meza. Tive outro bar e também fiquei à frente de um hostel, por cinco anos. Nessa época, como membro do SindRio, ganhei muitos prêmios, meio como hoteleiro, meio em função dos restaurantes. Foi então que me chamaram para fazer parte da diretoria. Depois de alguns anos, assumi da presidência.
RC: Como é estar representando os empreendedores, ser um líder e unir interesses na área de gastronomia?
FB: Não me vejo como líder, mas como parte de uma engrenagem. Aliás, uma engrenagem muito importante, que precisa funcionar. Acho que o associativismo é muito mal explorado. No entanto, é algo que pode resolver muito mais coisa. Assim, e vejo aqui como alguém que está colaborando para ter um SindRio mais forte, representando uma base de restaurantes cada vez melhor. Não é um momento fácil, né? Como se sabe, assumi no momento mais difícil do SindRio, justo no momento em que perdemos a contribuição sindical. Além disso, vivemos uma crise econômica sem precedente e os restaurantes são os mais afetados. Então, isso faz com que o desafio seja muito maior. Todavia, de outro lado, se é assim, então a recompensa, ao mesmo tempo, é também muito maior.
RC: Qual é o passo a passo para quem quer empreender no setor da gastronomia e não sabe por onde começar?
FB: Ser empreendedor, é estar disponível para o que vier a acontecer, para o bem ou para o mal, para o sucesso ou para o fracasso. Está tudo na sua mão. Portanto, para quem gosta de desafios, metas, sacrifícios etc., é muito legal. Se eu pudesse elencar um caminho, seria o seguinte:
Primeiro Passo
De início, para empreender você tem que ter o perfil empreendedor. Estar pronto para trabalhar e se arriscar mais que os outros. Por outro lado, você fica bem mais adaptado à sua própria vida. Passa a ser o personagem principal das suas escolhas.
Segundo Passo
Depois, se possível, é importante ter vivência com o negócio escolhido. Restaurantes, no meu caso. Recomendo muito. Trabalhe em algum lugar, procure entender o dia a dia. Pesquise ou então pelo menos converse muito com as pessoas que vivem isso. Porque depois que a pessoa pegar toda a economia da sua vida ou pegar dinheiro no banco, ou da família, e investir ali dentro não tem mais volta. É ganhar ou perder tudo.
Terceiro passo
Escolha ter o seu próprio negócio ou franquia, que também é um opção interessante e muita das vezes traz mais segurança. Porém, em contrapartida, a franquia não permite aflorar a liberdade criativa. Depende do objetivo de cada um.
Quarto passo
Ninguém sabe tudo. Se cerque de pessoas, empresas de assessoria e instituições que se complementam. Por exemplo, você é ótimo na área financeira? Então, vai precisar de alguém na área operacional. Entenda dentro da empresa sobre aqueles atributos que você não domina e que precisa passar a dominar, ou ter pessoas que te amparem nisso. Mesmo que no início não tenha como fazer esse tipo de investimento no começo, o empreendedor deve saber que essa é uma demanda necessária e que precisa ser posta no planejamento.
Quinto passo
Se associe ao SindRio, porque aqui o empreendedor terá todo amparo, networking, fornecedores, que podem encurtar o caminho do aprendizado. Temos aqui eventos, palestras, cursos e treinamentos, onde o associado não só absorve conhecimentos, mas conhece pessoas. E, o mais importante, ganha experiência no processo de trocar com parceiros.

RC: Recentemente, o SindRio conseguiu uma grande vitória ao negociar a redução da alíquota de ICMS aplicável a bebidas preparadas, que passou de 27% para 4%. Qual é o impacto disso para o mercado?
FB: O ICMS do Rio era 2% há 4 anos atrás; depois passou para 27%, o que tornou a atividade inviável. Conseguimos uma redução para 4%, mas ainda somos os mais caros do Sudeste, que é 3%. De todo modo, foi um grande passo. Aumentam as possibilidades e oportunidades para o negócio. Foi uma conquista para o setor.
RC: O SindRio também atuou fortemente para conseguir ajustes em leis como sobre Cardápio Vegano, Canudos, Copos Plásticos e muitas outras. A que você atribui essa vitória?
FB: Aprofundamos bastante na minha gestão a atuação junto ao legislativo. Bares e restaurantes são comumente objetos de projetos de lei. Estamos reagindo e conseguindo resultados satisfatórios. Primeiro, porque temos total isenção politico partidária. Isso foi muito bem percebido pelos legisladores de tal forma que a gente consegue caminhar muito bem por diferentes vertentes e ideias partidárias, tanto na Alerj como na Câmara. Em segundo, porque chegamos de maneira fundamentada. Levamos dados econômicos, sociais, jurídicos e estamos o tempo todo buscando o equilíbrio e o debate. Cada projeto de lei que não é discutido gera mais ônus/perdas do que resultados positivos.
RC: Qual é a chave para ter sucesso no mercado de restaurantes?
FB: Resiliência. O empreendedor vai apanhar, mas vai levantar. E quantas vezes ele se erguer, estará mais próximo de conseguir o sucesso. Ser empreender não é fácil. Empreender em restaurante, então, é ainda mais difícil. Muita gente erra porque a alimentação faz parte da vida de todo mundo e todo mundo cozinha um pouco, ou conhece alguém que cozinha.Além disso, os programas de televisão dão a impressão de que qualquer pessoa pode ser chef. E aí todos acham que podem ser donos de restaurante. Mas isso é uma imprudência. Ter um negócio no ramo de gastronomia é complexo e exige muita técnica e muito estudo. Por isso que o SindRio existe. Para dar suporte aos empreendedores.
RC: O que você pensa para o seu futuro em termos profissionais?
FB: Quero continuar a ser um ator relevante em processos de transformação. Gosto de participar de projetos que mudem a realidade de seu entorno. Isso só pode se dar no mundo associativo, que é onde estou hoje, no mundo dos negócios. Já abri empresas e abriria outras, mas sempre fazendo coisas que de fato gerem valor seja para a comunidade.
RC: Por você também ter tido formação em música, qual é o lugar que ela ocupa hoje na sua carreira?
FB: A música fica nos ouvidos… (risos)… Hoje sou somente um apreciador… Aliás, das artes em geral. Minha ligação com essa forma de expressão do talento humano me permite olhar o mundo de outra maneira, que melhora minha capacidade de tomar decisões no difícil dia a dia de um empreendedor brasileiro.
Foto: Carolina Oliveira
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Após esta entrevista, o SindRio teve mais duas conquistas:
- Assinou um convênio com o Procon, que visa mudar completamente a relação com o órgão.
- Uniu empresários de bares e restaurantes da cidade do Rio de Janeiro para discussões sobre o setor e formou um Conselho Consultivo de Negócios, que já realizou a sua primeira reunião, com muitos planos e projetos para a cidade maravilhosa.
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